quinta-feira, 10 de maio de 2018

Carros de Combate

A Moderna Guerra de Blindados 

O carro de combate (MBT) é tido como o principal ator no moderno campo de batalha e sua importância é fácil de ser explicada. O combate é a combinação do fogo e do movimento, tanto para o atacante como para o defensor. O MBT é capaz de realizar ambos. A infantaria é necessária para a ocupação do território, mas sem o apoio do blindado, a sua conquista será muito dificultada. Assim, cada vez mais, o esforço principal dos exércitos será dedicado ao apoio à sua ponta de lança blindada representada pelos carros de combate.
  
A história mostrou duas tendências no sentido do desenvolvimento de carros de combate: por uma lado, a Blitzkrieg, que enfatizou o movimento, baseando-se na penetração da frente inimiga e no rápido aproveitamento do êxito; por outro lado, o seu emprego como arma de apoio à infantaria, proporcionando-lhe vigoroso apoio de fogo.

Os requisitos de ordem tática impuseram diferentes resultados de natureza técnica, em uma vasta gama de variedades de carros de combate. Leves, médios e pesados, os diferentes modelos enfatizaram ora a mobilidade, ora o poder de fogo. No entanto, desde os meados dos anos 60, tentou-se chegar a um único carro, capaz de equilibrar essas duas características com a proteção blindada. Este carro passaria a ser chamado de tanque de batalha principal (Main Battle Tank - MBT).

A combinação entre estes três aspectos mostrou diferentes tendências, de acordo com necessidades de ordem tática das diferentes doutrinas de emprego. Novas blindagens permitiram a sobrevivência do tanque após o surgimento das primeiras armas anticarro com carga oca, as bazookas. Isto representou, por outro lado, uma elevação no peso total do veículo, o que gerou a necessidade de motores mais potentes. Já que o maior inimigo de um carro de combate é outro carro de combate, poder de fogo e proteção são inevitavelmente ligados.
A história do desenvolvimento dos tanque é a história da busca de novo equilíbrio, após a introdução de uma fator de desestabilização.


PODER DE FOGO  
      
    O primeiro fator de desequilíbrio foi a introdução da munição APDS (armour-piercingdiscarding sabot - perfuradora de blindagem com calços descartáveis), uma invenção britânica inicialmente empregada em canhões anticarro no final da II GM.

    Os calços descartáveis continuaram a ser empregados em novas munições cinéticas anticarro, isto é, em granadas que aproveitavam a energia cinética oriunda da velocidade e massa do projétil para penetrarem as blindagens, ao invés de empregarem a energia oriunda da detonação de alto-explosivos. Os projetis são feitos de material de alta densidade como o tungstênio ou urânio. A velocidade inicial do tiro foi aumentada com a adoção do canhão de alma lisa, sendo a granada estabilizada por meio de aletas.

    Os soviéticos empregaram pela primeira vez este tipo de canhão nos carros T-62, no início dos anos 60, e, na década seguinte, os norte-americanos empregaram o canhão alemão 120 mm nos seus carros.
    O canhão de alma lisa é um pouco menos preciso que o raiado. Sua munição é mais cara que a convencional. Em conseqüência, todo esforço é feito para alcançar uma grande velocidade inicial, permitindo a destruição do alvo com um único tiro.
    Os outros tipos de munição anticarro empregam a energia química, oriunda de alto-explosivos, de duas formas.
    • Os alto-explosivos de cabeça esmagável (HESH - high explosive squash head) têm carga explosiva que se amoldam contra a blindagem e que, ao serem detonadas por espoletas de culote, criam ondas de choque que são transmitidas através da blindagem e que se refletem no interior do veículo, liberando estilhaços de suas paredes internas que destroem o seu interior. Este tipo de munição pode ter seu efeito atenuado pelo emprego da blindagem espaçada, ou seja com espaços vazios que não transmitem a onda de choque ou pelo ângulo acentuado da carroceria, que dificulta o impacto perpendicular.
    • As mais eficientes granadas anticarro HEAT (high explosive anti tank) empregam a carga oca, que produz um jato capaz de penetrar a blindagem. A eficiência deste tipo de granada aumenta com o calibre e diminui com a rotação, sendo preferencialmente estabilizadas por aletas. A maior proteção contra este tipo de munição é, atualmente, a blindagem reativa, além de um redesenho dos interiores dos carros, com melhores medidas de proteção contra incêndio.
    Os canhões 105 mm L7 raiados britânicos foram largamente empregados no ocidente, em especial no M60, nas primeiras versões do M1 Abrams, no Leopard 1 e no S-tank sueco. O canhão 120 mm L11, raiado, também britânico, foi empregado no Chieftain e no Challenger. Já o alemão 120 mm de alma lisa passou a dotar o Leopard 2 e as versões mais modernas do Abrams.

    Pelo lado soviético, os preferidos foram o já citado canhão 115 mm, alma lisa, que equipa o T-62 e, posteriormente, o 125 mm do T-80.

    A capacidade de armazenamento de munição varia de cerca de 45 tiros (T-62) a 60 (Leopard).

    A performance de um MBT é diretamente proporcional ao seu sistema de controle de tiro. Torres giro-estabilizadas capazes de manter o canhão apontado para o alvo, mesmo em movimento, tornaram-se padrão nos carros mais modernos. No entanto, o progresso na eletrônica vem permitindo que o tempo gasto na pontaria seja cada vez mais reduzido. O emprego do telêmetro laser acoplado aos visores de pontaria e ao computador balístico produzem uma grande probabilidade de acerto no primeiro tiro e uma redução no tempo de engajamento.
      
    O visor de pontaria dos modernos MBTs é estabilizado, no mínimo, em elevação e o canhão e a metralhadora coaxial são escravos dele. O computador armazena dados sobre a performance dos diferentes tipos de munição (e de seus diferentes lotes) e sensores coletam informações sobre fatores que influirão no comportamento balístico do tiro, tais como a velocidade e direção do vento, temperatura ambiente e do propelente (carga de projeção), pressão barométrica, desgaste e temperatura do tubo, ângulo de sítio e distância entre canhão e o visor de pontaria. Estes dados podem ser introduzidos tanto manualmente quanto automaticamente.

    Com a finalidade de reduzir variações no comportamento do tiro, mangas térmicas são colocadas em torno do tubo, mantendo-o a uma temperatura uniforme. O visor de pontaria do atirador tem normalmente um ajuste na ampliação e no campo de visão e possui recursos de visão termal que possibilita a visão tanto de dia quanto à noite ou sob condições de tempo adversas. Ele é acoplado a um telêmetro laser.
      
    Ao identificar o alvo, o atirador seleciona o tipo de munição; o computador irá gerar um ponto luminoso no visor, que é colocado pelo atirador sobre o alvo. A partir daí, o canhão estará apontado; quando estiver pronto para o tiro, após ser carregado, dará um sinal ao atirador.
    O comandante do carro tem seu próprio visor, que permite alternar sua imagem com a do atirador, fazendo com que ele possa acompanhar o procedimento para o tiro ou estar procurando novos alvos durante o engajamento. O comandante pode, ainda, assumir o controle do tiro para si.

    Tal sofisticação permite que alvos sejam engajados em poucos segundos, com probabilidade da ordem de 80% de serem atingidos pelo primeiro tiro para alvos estacionários a 3.000 m ou móveis a 2.000 m.


    PROTEÇÃO 

    O grau de proteção proporcionada pela blindagem é um fator de sobrevivência. Normalmente, a proteção convencional de aço é capaz de impedir danos causados por projetis de metralhadoras, pequenos canhões e granadas alto-explosivas de artilharia. Para proteção contra munição especializada antitanque, um considerável reforço na blindagem torna-se necessário, envolvendo considerável aumento de peso.
      
    A difusão do uso de armas antitanque dotadas de carga oca levou ao desenvolvimento da blindagem composta. As primeiras blindagens deste tipo foram desenvolvidas em um centro de estudos britânico a localidade de Chobam, de onde veio o nome pelo qual passaram a ser conhecidas.

    Essencialmente, esta blindagem envolve o arranjo de diversas camadas de chapas de vários materiais, com espaços entre elas. Estes espaços ajudam a tornar o jato provocado pela granada HEAT ineficiente, enquanto as várias camadas diminuem o impacto da energia cinética do projetil. Por outro lado, esta blindagem é bastante pesada, representando um aumento de cerca de 20% do peso do carro. Em conseqüência, não costuma ser empregada em torno de todo o carro, substituindo a blindagem convencional, sendo empregada em placas (muitas vezes removíveis) para proteger os pontos mais sensíveis, como a torre e parte frontal.

    Outras formas de blindagem mais modernas são a de cerâmica e a reativa. Esta última possui uma fina camada de explosivo que detona ao ser atingido por uma granada com carga oca, interrompendo o jato.

    A parte do carro de combate com maior probabilidade de ser atingida é a sua torre. Em conseqüência, é a parte do carro com maior proteção blindada. Suas partes frontais e laterais recebem espessa proteção e têm um desenho inclinado para desviar projetis cinéticos ou HESH. O uso da blindagem composta tem seu efeito sobre o desenho da torre, fazendo com que carros como o Abrams e o Leopard tenham suas laterais revestidas com placas. 

    Outra área bastante protegida é a parte superior da frente da carroceria. As espessuras máximas da blindagem não costumam ser reveladas. Tem-se como prováveis os seguintes dados, no entanto:
      • o M60 tem espessura máxima de 120 mm, com um peso total de 49 t.
      • o Leopard 1, desenhado com ênfase na mobilidade, tem pequena espessura, com um peso total de 39,5 t.
      • o T-62, contemporâneo dos modelos acima, também era levemente blindado, confiando a sua proteção ao seu desenho arredondado e na sua baixa silhueta. Tem peso total de 37,5 t.
      • o T-72, oficialmente com 41 t, tem uma blindagem de 200 mm de aço na sua parte frontal e, em outra versão, 100 mm de blindagem composta.
    A geração mais nova de MBTs teve um sensível aumento de peso em virtude do acréscimo de blindagem composta. O Abrams tem um peso de 54,5 t; o Leopard, de 55 t; o T-80 48,5 t e o Challenger, 61 t.
      
    Sistemas de controle de incêndio crescem de importância, na medida em que a munição HEAT baseia-se nos efeitos secundários do fogo e jato de gás para alcançar muitos dos seus efeitos letais.

    Neste contexto, a substituição da gasolina por diesel e tanque de combustível auto-selante mostraram-se bastante úteis. Outras medidas foram adotadas, como a guarda de munição em compartimentos individuais, separados do compartimento da tripulação por paredes duplas entre as quais é colocado água pressurizada, glicol ou outro líquido extintor de incêndio e a presença de portas que se abrirão para o exterior no caso de explosão.
    Outra ameaça é o emprego de agentes QBN pelo inimigo. A proteção contra estes agentes já se tornou equipamento padrão nos carros modernos e consiste basicamente de filtros que produzem ar descontaminado a pressões suficientemente altas para impedir que o ar externo penetre para o interior através de pequenas aberturas. Este sistema não alivia o uso de equipamento individual de proteção para a tripulação, como forma de prevenir possíveis falhas no sistema. No caso de explosões nucleares, a blindagem convencional é capaz de deter a radiação alfa, beta e gama; a única deficiência refere-se à proteção contra nêutrons, que conseguem penetrá-la.
    Os carros de combate são equipados para criarem suas próprias cortinas de fumaça, produzida tanto por granadas fumígenas quanto pela queima de óleo no motor. Visores termais fazem esta proteção ineficiente. Há, no entanto, novos geradores de fumaça capazes de bloquear a passagem de radiação infravermelha, utilizada por estes sistemas.

    A partir do surgimento dos modernos sistemas de controle de tiro, que permitem detectar o inimigo e o disparo em poucos segundos, qualquer redução do período em que o tanque fica exposto, principalmente após ter disparado um tiro, representará maior capacidade de sobrevivência.



    MOBILIDADE  

      A despeito de todas as medidas de proteção, o fator que garantirá ao tanque a maior capacidade de sobrevivência é a sua mobilidade, ou seja, a capacidade de ultrapassar obstáculos, realizar rápidas manobras e atingir maiores velocidades em terreno desfavorável. 
        
      Nos anos 60, quando a potência dos motores oscilava em torno dos 750 HP, o Chieftain e o M60 tinham uma relação peso/ potência de 13,7 hp/t e 11,4 hp/ t, respectivamente. O T-62, com somente 580 hps de potência disponíveis, tinha uma relação de 14,5 hp/t. Em 1965, com um motor de 830 hp e o peso reduzido ao mínimo, o Leopard 1 entrou em serviço com uma relação de 20,75 hp/t e uma reputação de excepcional capacidade de tráfego pelo campo.
        
      A atual geração de motores oferecem uma potência muito superior:
        • 1200 hp no motor 12 cilindros, diesel, do Challenger;
        • 1500 hp no motor 12 cilindros, diesel, do Leopard 2;
        • 1500 hp na turbina a gás do Abrams.
      Assim, ainda que os pesos tenham sido aumentados consideravelmente, a relação peso/potência também aumentou razoavelmente:
        • 27,3 hp/t no Leopard 2;
        • 21 hp/t no Abrams;
        • 19,7 hp/t no Challenger, um monstro de 61 t, que se assemelha à relação do Leopard 1.
      O aumento de potência e da relação peso/potência teve pequeno efeito no que se refere à velocidade máxima por estrada. Os carros da década de 60 tinham suas velocidades máximas em torno de 50 km/h, enquanto os mais modernos têm máximas em torno de 60 km/h. Exceção à esta regra são os alemães Leopard 1 e 2, que têm máximas próximas a 70 km/h, com suas transmissões sendo projetadas para proporcionarem esta performance.

      A manobrabilidade é proporcionada pelo sistema de transmissão e pelas lagartas. Neste aspecto, quanto maior o comprimento das lagartas no solo, mais afastadas elas devem estar. Por outro lado, restrições de largura impostas por considerações de tamanho (e, portanto, peso, custo e área do alvo) e a necessidade de empregar as estradas e pontes existentes geram um conflito com outro requisito: a reduzida pressão sobre o solo, em especial para operações em terreno pouco firme.

      Em números simples, todos os MBTs modernos podem ultrapassar valas de aproximadamente 3 metros de largura e obstáculos verticais de 0,90 a 1,20 m. A passagem a vau de 1 m não representa limitação, sendo possível equipá-los com snorkels para permitir a ultrapassagem submersos de cursos d'água mais profundos.

      SOLUÇÕES PARA DESENHO DOS MODERNOS TANQUES

      A partir das opções e conflitos mostrados acima, torna-se claro que o desenho final de um tanque dependerá do compromisso desejado entre mobilidade, proteção e potência de fogo.
        
      Na geração anterior, o Chieftain britânico fora projetado para ser capaz de atingir seus oponentes sem ser atingido, sobreviver melhor e ir a qualquer lugar no campo de batalha, embora devagar. O alemão Leopard 1 foi desenhado para deslocar-se por maiores distâncias e mais rapidamente, com um canhão útil somente para sua proteção. O M60 americano, projetado para um cenário de conflitos mundiais, sob as mais diferentes condições climáticas e mais diversas ameaças, apresenta um razoável equilíbrio.

      Na geração atual aparece um convergência ainda maior, com um razoável equilíbrio no Challenger britânico, Leopard alemão e Abrams americano. Os carros russos sempre se concentraram no balanço, tendo atingido bons resultados com veículos de muito menor tamanho que os ocidentais.
        
      A razão dos carros russos terem conseguido manter um baixo peso, ainda que mantida a proteção blindada e o poder de fogo, reside em detalhes de seus projetos. O motor montado transversalmente e transmissão compacta permitem uma redução significativa de volume. A capacidade de transporte de munição foi reduzida, assim como o tamanho dos tanques de combustível. A tripulação é de três homens, com menos espaço disponível; para isto, os canhões são de carregamento automático. Finalmente, os canhões somente podem ser abaixados em cerca de 4 graus, contra 10 dos carros ocidentais.
        
      Estas soluções refletem compromissos considerados aceitáveis do ponto de vista doutrinário russo: em primeiro lugar, eles têm mais unidades que qualquer adversário, o que torna a necessidade individual de munição menor; o menor espaço para a tripulação é resolvido ao se recrutar soldados de no máximo 1,60 m; finalmente, a depressão menor do canhão tem um papel mais significativo para um tanque na defensiva, que não era a missão primordial destes carros.
        
      Fora da OTAN e dos antigos membros do Pacto de Varsóvia, surgiram soluções de desenho bastante interessantes, para atenderem a necessidades específicas. O sueco Stridsvagn 103, ou S-tank, dispensou a torre, tendo um canhão fixo, apontado juntamente com todo o carro. Em elevação, esta pontaria é feita ajustando-se a suspensão para a altura indicada. Ele é extremamente bem protegido, tanto em termo de blindagem quanto em relação à área que oferece como alvo, tem boa mobilidade, com uma combinação de um motor diesel principal com uma turbina a gás para potência adicional. Sua principal deficiência é a incapacidade de atirar em movimento.

      O israelense Merkava é mais convencional na aparência, mas é único no que se refere à montagem do motor à frente da carroceria, ao invés da solução convencional de montá-lo à retaguarda. Tal fato deve-se à intenção de melhor proteger a tripulação, refletindo a deficiência israelense de obter novos soldados. Sua relação peso/potência é de 16 hp/t, o que traz reflexos sobre a velocidade máxima que pode atingir: 46 km/h. Esta solução de desenho, além de trazer um melhor proteção, criou um espaço vazio à retaguarda onde mais munição pode ser estocada, além de transportar seis fuzileiros equipados.


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