sábado, 20 de maio de 2017

BERNARDINI

A Bernardini S.A. Indústria e Comércio foi fundada em 1912, em São Paulo (SP), por imigrantes italianos. A empresa se desenvolveu como fabricante de cofres, portas blindadas e móveis de aço. Na década de 60 teve suas primeiras experiências no setor automotivo e na área militar, ao fabricar carrocerias para caminhões dos Fuzileiros Navais e do Exército. Mais tarde (sempre em paralelo à fabricação de cofres), também construiu carrocerias blindadas para  transporte de valores.
A empresa tomaria rumo diverso a partir de 1972, quando foi instada pelo Exército a colaborar na modernização dos tanques M3-A1 Stuart, processo a cargo da Biselli, vindo a partir daí a se dedicar cada vez mais ao segmento militar. Na oportunidade, a Bernardini foi responsabilizada pela construção das suspensões e torre blindada para o novo veículo. As especificações definidas levaram a uma reforma tão profunda que deu origem a um novo tanque, o X1-A1, que evoluiu para o X1-A2 Carcará – primeiro carro de combate sobre lagartas construído no país. Entre 1978 e 1980 o Exército criou mais dois modelos a partir do chassi sobre lagartas do X1-A1, gerando nova família de equipamentos: o Carro Lançador Múltiplo de Foguetes XLF-40 e o Lançador de Ponte XLP-10. O primeiro dispunha de rampa para o lançamento de três foguetes X-40 Avibrás, com alcance de até 65 km, e quatro sapatas hidráulicas para estabilização; apenas um exemplar foi construído. O segundo carregava uma ponte de 10 m de comprimento com capacidade para 20 t, construída em alumínio estrutural, que podia ser lançada em três minutos através de sistema hidráulico totalmente automático; além do protótipo, foram produzidas mais quatro unidades. Derivado do X1-A1, em 1982 foi ainda montado um protótipo de blindado antiaéreo (denominado M3), equipado com mira ótica e quatro metralhadoras (3.200 tiros/min e 750 m de alcance) que, no entanto, não passou da fase de testes.
Em 1984 a Bernardini participaria do desenvolvimento de mais um tanque especializado, o Sherman M4 na versão anti-minas, que também se manteve no estágio de protótipo. Estes blindados médios, chegados ao Brasil em 1943, em plena II Guerra, já tinham sido objeto de duas tentativas de modernização, entre 1969 e 1975 (Ü Exército) e em 1977 (na própria Bernardini, quando foi projetada sua transformação em um lança-pontes de 20 m e capacidade de 30 t). A nova iniciativa envolveu a troca do motor MWM por um Scania de 400 cv, a eliminação da torre e seu canhão e a instalação, na dianteira, de dois roletes anti-minas com três toneladas de peso importados de Israel.
Dado o sucesso da modernização dos tanques Stuart, o Exército resolveu aplicar os mesmos conceitos à sua frota de 250 carros médios M-41 Walker Bulldog, comprada usada dos EUA no início da década de 60. Apesar de serem muito mais modernos do que os Stuart, eram acionados por um motor Continental a gasolina refrigerado a ar de 500 cv, que consumia inacreditáveis 3,3 litros/km. Além disso, suas revisões mecânicas vinham se tornando cada vez mais caras e difíceis pela necessidade de importação de componentes já raros no mercado. A partir de 1980 a frota de tanques começou a ser reformada: o motor foi trocado por um diesel Scania V8 turbinado com 400 cv (elevando a autonomia de 280 para 600 km), foram substituídos caixa, transmissão, lagartas, componentes da suspensão, rádio e sistema de pontaria, todos por outros de fabricação nacional; a blindagem frontal e a torre foram reforçadas e alguns exemplares ganharam saias de aço. O canhão original, de 76 mm, foi usinado e aumentado para 90 mm, permitindo padronizar sua munição com o Engesa Cascavel. O novo tanque recebeu a  denominação M41-C Caxias. A Bernardini produziu cerca de 150 unidades, além de kits de transformação exportados para as forças armadas de alguns países. Os tanques Caxias hoje compõem a maior parte da frota de blindados sobre esteira do Exército Brasileiro.
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Blindado sobre lagartas M41-C Caxias (fonte: site brasilemdefesa).











A experiência adquirida pelo Exército em todas estas realizações permitiu-lhe dar um passo mais ambicioso e projetar, junto com a Bernardini, o primeiro carro de combate sobre esteiras de concepção nacional. A idéia era ter um substituto para o Caxias que conjugasse “estado da arte”, máximo desempenho, confiabilidade e padronização com a mínima dependência externa, necessariamente levando em conta as restrições orçamentárias da Arma. O projeto teve início em 1979; quase cinco anos depois, em maio de 1984, foi feita a apresentação do produto final – o MB-3 Tamoyo (até então conhecido por X-30) – tanque médio de 30 t com 98% de nacionalização (em peso), inspirado no alemão Leopard II, então considerado um dos mais avançados no mundo. Era a seguinte a configuração mecânica do Tamoyo: motor traseiro V8 Scania diesel com dois turbocompressores e 736 cv; caixa de transmissão do Caxias, acoplada ao motor num conjunto de desmontagem rápida; freio hidromecânico com retarader, atuando na transmissão; suspensão por barras de torção e amortecedores, com seis rodas de apoio de cada lado (rodas de direção à frente). A torre, com mecanismo de giro elétrico, era equipada com um canhão de 90 mm; a cabine, para uma tripulação de quatro, dispunha de ar condicionado. O Tamoyo podia incorporar toda a tecnologia de ponta então disponível no setor bélico, tal como computador de tiro, pontaria a laser, proteção QRB (química, radiativa e biológica) e visores infravermelhos.
O projeto do Tamoyo foi elogiado pelo equilíbrio entre atualização tecnológica, simplicidade construtiva e de manejo – características comuns, aliás, no material bélico produzido no Brasil. Esta “simplicidade”, porém, nem sempre atendia ao mercado externo, e para atraí-lo a Bernardini lançou as versões mais sofisticadas Tamoyo II e III, ambas com motor V8 Detroit Diesel importado. A primeira, com potência de 736 cv e transmissão hidromecânica GE, recebeu blindagem composta aço-cerâmica, canhão inglês de 105 mm, visores noturnos, sistemas de estabilização (permitindo o tiro em movimento) e direção de tiro por computador. O Tamoyo III teria um motor com 900 cv, caixa Allison e blindagem ainda mais reforçada, além de ganhar telêmetro laser e todo o restante equipamento já previsto na versão intermediária.
Foram construídos apenas cinco exemplares do Tamoyo: o melhor produto da Bernardini seria, ao mesmo tempo, o seu “canto de cisne”. Em meio a cortes orçamentários e à proliferação da oferta, a baixo preço, de equipamentos estrangeiros usados, no início da década de 90 o Programa Militar Brasileiro entrou em crise, sua sentença de morte chegando com a retirada, pelo governo Collor, do restante apoio ao desenvolvimento nacional de equipamentos militares.
Os dois últimos projetos militares da Bernardini foram viaturas leves de apoio. Em 1985 preparou o jipe Xingu (inicialmente Vitória) para participar de concorrências do Exército e Fuzileiros Navais. Na prática, tratava-se apenas de uma versão militarizada do Toyota Bandeirante, com bitola alargada e três comprimentos de chassi. As alterações eram as usuais para o tipo de veículo: guincho, acoplamento para reboque, para-brisa rebatível, santantônio, faróis militares e suspensão reforçada. Em 1988 a empresa começou a produzir o veículo anti-distúrbio AM-IV 4×4, um pequeno blindado montado sobre o chassi curto do mesmo Toyota, com três portas (uma traseira), escotilha no teto, seteiras, lançadores de granadas de gás, ar condicionado e filtro contra gases na cabine. O carro foi dotado de freios a disco ventilados na frente, embreagem hidráulica e dois tanques de combustível com alimentação pelo interior da cabine. Cerca de 50 veículos foram fabricados, a maior parte exportada para o Chile.
A produção desses carros deu uma sobrevida à Bernardini mas não foi suficiente para sustentar seu parque industrial. Suspenso o apoio financeiro do Exército, logo foi interrompido o desenvolvimento do tanque Tamoyo (situação agravada pela competição suicida da Engesa, que projetava um equipamento concorrente – o Osório). Sem um produto competitivo no mercado externo e sem encomendas internas, a situação da empresa rapidamente se agravou.
Em 1993 sua maior concorrente, a Engesa, encerrava as atividades. A partir de 1996 o Brasil volta a importar excedentes de guerra para equipar suas Forças Armadas, como fazia trinta anos antes. Em 2001, por fim, também a quase centenária Bernardini cerra definitivamente as portas.


BAE SYSTEMS

Maior multinacional britânica fabricante de equipamentos militares, de segurança e aeroespaciais, também atuante na engenharia naval e na indústria de sistemas eletrônicos de inteligência e controle. (Constituída em 1999, a BAE Systems resultou da fusão da British Aerospece – BAe e da Marconi Electronic Systems.) Com escritório de representação instalado em Brasília (DF), além de fornecer equipamentos de aviônica para a Embraer a empresa recentemente construiu três navios de patrulha oceânica para a Marinha Brasileira.
Em 2011 a BAE foi contratada pelo Exército para dar apoio técnico à modernização de parte da frota nacional de blindados de transporte de pessoal M113B, a ser realizada mediante convênio firmado com o Departamento de Defesa dos EUA. A reforma, executada pelo Exército, no Parque Regional de Mecanização de Curitiba (PR), envolveu a substituição de cerca de 20% dos elementos estruturais, do sistema de suspensão e lagartas; as viaturas (agora denominadas M113A2 Mk1) receberam câmbio automático e (incompreensivelmente) motores Detroit Diesel de 265 cv importados. Pelo menos um dos 150 veículos incluídos no lote inicial deveria ser equipado, para avaliação, com sistema de visão noturna com câmera de infravermelho. Em dezembro de 2014 foi entregue a 100unidade reformada.
Em 2014 a BAE foi uma vez mais contratada, agora para a modernização de 32 viaturas obuseiras M109A5, cedidas para o Brasil, entre 2012 e 2014, pelos EUA. Dessa vez, porém, a operação seria executada nas instalações norte-americanas da empresa.
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M113A2 Mk1: esta foi a centésima unidade reformada pelo Exército com apoio técnico da BAE (fonte: site baesystems).

AVIBRAS

A Avibras Aeroespacial S.A. é hoje o maior fabricante brasileiro de equipamentos de defesa. É também o único sobrevivente do extenso programa de modernização da indústria bélica nacional patrocinado pelo Governo Federal nos anos 70. A Avibrás foi fundada em 1961, em São José dos Campos (SP), onde também se localizam o ITA e o CTA, centros de excelência na formação de engenheiros e na geração de pesquisa aeronáutica que ao longo dos anos consolidaram o município como principal pólo aeroespacial do país. O primeiro produto da empresa foi o avião para treinamento básico Falcão; ainda nos anos 60 desenvolveu o primeiro propelente sólido sintético nacional para uso espacial, dando início a dois ramos de negócio nos quais se especializaria – a indústria química de propelentes e explosivos e a fabricação de mísseis militares. A transição para o ramo dos mísseis se deu em 1965, quando o CTA repassou à empresa a tecnologia do foguete Sonda, para pesquisas científicas, que acabava de desenvolver. Em 1976 a Avibrás passou a também atuar como fabricante de antenas parabólicas para comunicação via satélite.
Da mesma forma como aconteceu com todos os fabricantes de materiais de defesa do país, o grande crescimento da Avibrás ocorreu a partir de 1977, com o fim do Acordo de Assistência Militar com os Estados Unidos, vigente havia 25 anos e denunciado pelo Brasil em 11 de março daquele ano. A indústria brasileira já vinha experimentando na altura um proveitoso relacionamento com as instituições de pesquisa das Forças Armadas, que concebiam armamentos, aeronaves, embarcações e veículos modernos, repassando os projetos às empresas privadas para que estas os colocassem em produção, sem cobrança de custos nem exigência de pagamento de direitos ou royalties. A denúncia do Acordo com os EUA fortaleceu esse vínculo e assegurou inédita independência comercial do país no setor, com reflexos quase imediatos no mercado externo. Assim, aproveitando-se da conjuntura internacional favorável (e do apoio logístico do Itamaraty) em menos de três anos o Brasil se tornou um dos maiores fornecedores mundiais de material bélico.
A expansão da lista de produtos da Avibras foi permanente. Em 1977 iniciou a produção da linha de foguetes militares SBAT (ar-ar e ar-terra, desenvolvidos pelo CTA) e construiu os primeiros protótipos dos motores-foguetes X-20 e X-40 (respectivamente projetados pelo CTA e IME, com alcance de até 60 km) e do sistema Transit de recepção de navegação por satélite, para a Marinha. Em 1980 já trabalhava (sempre com o CTA) no desenvolvimento de mísseis multifásicos para lançamento de satélites artificiais e de mísseis teleguiados para uso militar com alcance de até 300 km. Em 1981 a empresa contratou com o Iraque a venda de US$ 500 milhões em mísseis, para isto tendo que expandir sua (segunda) unidade industrial de São José dos Campos. No ano seguinte foi a vez do projeto do lançador múltiplo 108-R, para 16 foguetes ar-ar e ar-terra.
Em 1983 a Avibras lançou seu primeiro veículo terrestre – o Astros II (Artillery Saturation Rocket System), apresentado em cinco variantes, compondo um sistema integrado de defesa antiaérea de alta mobilidade e precisão que viria a ser seu best-seller. A viatura principal é um lançador de mísseis terra-terra equipado com rampa móvel dupla – único equipamento de lançamento no mundo capaz de ser facilmente convertido para três calibres diferentes. Cada módulo aceita 32 foguetes calibre 127 mm, 16 calibre 180, um foguete calibre 300 ou um míssil tático TM (este com até 300 km de alcance). As quatro outras variantes são um sistema diretor de tiro compreendendo radar e computador para controle dos disparos, uma viatura remuniciadora com grua hidráulica, outra para comando e controle e um veículo de apoio para oficina e transporte de tropas.
As quatro versões tinham a mesma base – um caminhão 6×6 semi-blindado de 10 t (motor Mercedes-Benz V8 importado de 284 cv e 106 kgf.m a 1200 rpm), fabricado pela Tectran, empresa criada em 1982 pela Avibras para produzir veículos para transporte e uso civil. Montado sobre um chassi com longarinas de perfil U, o veículo tinha suspensão traseira em tandem (feixe de molas semi-elípticas invertido), caixa com cinco marchas com reduzida e bloqueio nos três diferenciais, direção hidráulica e controle interno da pressão dos pneus; a cabine era blindada. Em pouco tempo o Astros passou a ser um dos principais itens de exportação da empresa.
Universalmente reconhecido como um dos sistemas mais versáteis, eficazes e de maior precisão da categoria, o Astros II ainda se encontra em produção. Hoje na 6geração (Mk5), é agora montado sobre o moderno chassi tubular de longarina central Tatra, de origem tcheca, com motor V8 refrigerado a ar, tração integral e suspensão pneumática independente. À família foi agregada uma versão equipado como estação metereológica, com apenas dois eixos, configuração também assumida pela variante VCC, de comando e controle.
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Sistema Astros de defesa, grande sucesso mundial da Avibrás.
Em 1984 a Avibras passou a fabricar mais dois mísseis de moderna tecnologia: o Barracuda, primeiro antinavio brasileiro, e o Piranha, ar-ar com sensor infra-vermelho, que persegue o alvo atraído pelo calor do motor. Em 1985 lançou o Fila (Fighting Intruders at Low Altitude), sistema de contra-ataque aéreo de baixa altitude, também pela primeira vez fabricado no país. Estes equipamentos se juntaram aos demais produtos da Avibras, na época já com grande penetração no mercado mundial. As nações do chamado Terceiro Mundo, especialmente os países árabes, eram cada vez mais atraídas pelos armamentos brasileiros, não apenas pela qualidade e tecnologia agregada mas também pela simplicidade de concepção e manejo, flexibilidade e baixo custo. O mercado interno era (e é cada vez mais) restrito, e a indústria nacional crescia aceleradamente quase que com base nas vendas externas. No caso da Avibras, estas correspondiam a uma carteira de mais de um bilhão de dólares, respondendo por cerca de 90% do seu faturamento. Situação muito instável, pois, que se inverteria a partir de 1990, quando o setor perderia mercado e entraria em crise.
Foram muitos os fatores simultâneos que contribuíram para a retração da presença brasileira no mercado bélico mundial: sucessivos cortes de verbas das Forças Armadas (na prática, as financiadoras indiretas da indústria, por meio da cessão gratuita de tecnologias e projetos), situação muito agravada após a posse do governo Collor, em março de 1990; embargo internacional ao Iraque (maior cliente militar do Brasil); desmantelamento da União Soviética e das repúblicas do leste europeu e conseqüente mudança do foco da geopolítica norte-americana, da “Guerra Fria” para Israel e os países árabes; maior influência dos EUA sobre seus aliados da região (em especial Arábia Saudita e Kuwait), substituindo o Brasil como fornecedor de material bélico; maior agressividade dos fabricantes de armamentos europeus no mercado do Oriente Médio. Culminando tudo, a longa guerra de oito anos entre Iraque e Irã passou a requerer equipamentos cada vez mais sofisticados, que o Brasil já não estava preparado para fornecer.
Em pouco tempo faliram muitas empresas do setor, inclusive a Engesa, a maior delas. A Avibras entrou em concordata. Como via alternativa, a empresa aumentou a ênfase no fornecimento para o mercado civil (telecomunicações, informatização, autopeças), tanto diretamente como através de suas subsidiárias Tectran e Tectronic (posteriormente Powertronics). A diversificação sempre foi, aliás, uma das preocupações do Grupo Avibras. Em 1987, por exemplo, a empresa iniciou o projeto do que chamou Ônibus Urbano Brasileiro, um chassi com motor projetado pelo CTA com o apoio da Finep – um bicombustível a álcool e gás natural com 240 cv. Tanto o motor como os diversos componentes mecânicos seriam fabricados pelas próprias empresas do Grupo, que para isso pretendia construir uma linha de produção para dez mil chassis e vinte mil motores por ano. A crise chegou antes que os planos pudessem ser concretizados.
Quanto à área bélica, a situação se recuperaria aos poucos e só em meados da década de 90 seria desenvolvido um novo veículo automotor, o Astros Hawk, lançador leve de foguetes montado sobre um pequeno 4×4 fabricado pela Tectran e apto a operar com os novos mísseis Skyfire para alcance de até 12 km. Mais tarde, em 1999, montou um protótipo (ainda não industrializado) do que deveria ser o Astros III, com tração 8×8.
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O Sistema Astros é hoje composto por veículos de dois e três eixos com sete diferentes funções especializadas.
Em 2001, respondendo a um contrato firmado com a Malásia, a Avibras lançou a linha AV-VBL (Viatura Blindada Leve), veículo blindado 4×4 montado sobre chassi Mercedes-Benz Unimog U 2150L alemão alongado, trazendo motor diesel de quatro ou seis cilindros (150 ou 280 cv), caixa mecânica de oito marchas com bloqueio de diferencial, caixa de transferência e opção de tração 4×2. O veículo, proposto como equipamento de apoio para o Sistema Astros, pode ser configurado de diversas maneiras, combinando-se níveis de proteção, tipos de armamento, layout interno e acessórios. São três plataformas, com peso total entre quatro e doze toneladas e acomodação para três a doze tripulantes; já foram fornecidas versões VCC e PCC (viaturas de comando e controle) e posto meteorológico. Também são previstas variantes equipadas com radar de vigilância e preparadas para as funções de posto de observação avançado, ambulância, transporte de pessoal e reconhecimento.
Em 2003 foi lançado mais um blindado leve, o AV-VB4 RE Guará, desta vez sobre o chassi Unimog 4000, com motor turbo de quatro cilindros e 177 cv. Projetado em conjunto com o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do Exército, tem 7,6 t e é de menor porte do que o AV-VBL; apresenta o mesmo excelente comportamento fora-de-estrada porém maior velocidade no asfalto e autonomia de 600 km. É um veículo extremamente moderno, com freios a disco nas quatro rodas, ABS e a tradicional suspensão por molas helicoidais do Unimog. Tem carroceria monobloco de chapa de aço soldada e, assim como o VBL, é apresentado em grande número de configurações, inclusive como porta-morteiros, lança-mísseis anti-carro, para operações urbanas e polícia militar. São muitos os equipamentos de série: ar condicionado, sistema de renovação de ar com filtragem, sistema de aquecimento e piloto automático, entre outros. Dentre os opcionais, proteção anti-minas, proteção contra contaminação química e bacteriológica, sistema de regulagem da pressão dos pneus, torreta giratória para metralhadora, sistema automático de extinção de incêndio, periscópio para visão noturna, gerador de energia e sistema de navegação GPS.
Com o Guará, a Avibras pretendia conquistar encomendas do Exército para fornecimento da Nova Família de Viaturas Blindadas sobre Rodas que deveria equipar a arma. As concorrências públicas tardaram; com vendas externas reduzidas em função da crise mundial, em julho de 2008 a Avibrás entrou em regime de recuperação judicial. Outra bem sucedida exportação para a Malásia e a efetivação de uma grande encomenda do sistema Astros II pelas forças armadas brasileiras permitiram dar novo fôlego à empresa, que por fim retomou a liquidez, em 2011, após a conversão de parte das dívidas com o Governo Federal em participação acionária (a operação tornou a União detentora de cerca de 1/5 do capital da empresa).
Novo veículo só seria apresentado em 2014, a viatura 4×4 Tupi, mostrada em abril às autoridades brasileiras. O protótipo foi preparado em apenas quatro meses com a colaboração da francesa Renault Trucks Defense (empresa do grupo Volvo), para participar de concorrência internacional lançada pelo Exército Brasileiro destinada à escolha do modelo de viatura blindada leve para sua Nova Família de blindados sobre rodas (que por fim deslanchou, também incluindo o 6×6 Guarani, fabricado pela Iveco). Na realidade, se tratava da “tropicalização” do modelo francês Sherpa Light Scout, de 8 t (capacidade para até 12 soldados ou 2,5 t de carga e autonomia de até 800 km), equipado com uma série de armamentos e equipamentos de defesa produzidos pela Avibrás. (O original francês possui motor diesel de quatro cilindros e 173 ou 215 cv, caixa automática, suspensão independente e freios a disco nas quatro rodas com ABS.)
A proposta da Avibras envolvia diversas versões: comando e controle, transporte, radar, ambulância, defesa antiaérea e patrulha armada. Caso vencesse a concorrência, a empresa se comprometia a fornecer o lote inicial, envolvendo o fornecimento de 186 unidades, com 32% de nacionalização, alcançado em meados de 2016 índice superior a 60%. Em 2015, Avibrás e Iveco foram indicadas finalistas no processo seletivo conduzido pelo Exército. Concluída a avaliação, em abril do ano seguinte, porém, a escolha recaiu sobre o modelo proposto pela firma italiana.
Com base na experiência adquirida com a preparação do Tupi, a partir do final de 2014 a Avibras procedeu à atualização do blindado Guará. Denominado Guará 4WS, seu protótipo foi oficialmente apresentado na LAAD 2016. Viatura para operações militares e policiais urbanas com capacidade para cinco tripulantes e respectivo equipamento, trazia chassi de projeto próprio, motor Cummins de 204 ou 250 cv, câmbio automático e tração, suspensão independente e direção nas quatro rodas. Haveria versão para transporte de tropas, com capacidade para dez soldados. Com índice de nacionalização significativamente superior ao do Guará anterior, possuía como elementos importados apenas o sistema de direção das rodas traseiras, o rádio militar e o computador de bordo.
Ainda na linha dos veículos terrestres, a Avibras está hoje envolvida no desenvolvimento e fornecimento de equipamentos para atender ao programa federal Astros 2020, cujo objetivo é dispor de uma frota de lança-mísseis com alcance de 300 km e as correspondentes viaturas de apoio. O primeiro lote foi entregue ao Exército em junho de 2014 – seis lançadores múltiplos AV-LMU, uma unidade remuniciadora e duas outras para posto de comando e estação meteorológica; a encomenda compreende 50 veículos, a serem produzidos até 2018. A base para todos eles será o caminhão Astros II sobre chassi Tatra, em sua versão mais atualizada (Mk6).
O catálogo da Avibras conta hoje com apenas um produto para o mercado civil, o Locotrator rodoferroviário, para movimentação de composições ferroviárias em pátios de manobra, equipamento desde 1985 fabricado pela subsidiária Tectran.
<avibras.com.br>

 

VEROLME

Subsidiária da Verolme holandesa instalada em 1959 em Angra dos Reis (RJ), foi por duas décadas, ao lado da Ishikawajima, um dos maiores e mais ativos estaleiros do país. Em 1983 a empresa foi vendida para investidores brasileiros. O país mal saíra da recessão econômica, que vinha do início da década. Toda a indústria naval brasileira se encontrava em profunda crise, agravada pela redução dos subsídios estatais para o setor. A exemplo dos fabricantes de material ferroviário, que passavam por iguais tensões, os estaleiros buscaram na diversificação um caminho para a sobrevivência. A Verolme foi uma das primeiras a procurar saídas fora de seu mercado principal.
Ainda em 1983 a empresa anunciou seu plano de investimentos, que incluía desde a criação de gado e plantação de soja mediante incentivos fiscais até a utilização da capacidade ociosa das suas instalações para a fabricação de embarcações militares, dragas e equipamentos pesados para mineração e construção civil, inclusive autopropelidos.
O primeiro veículo cogitado foi um caminhão fora-de-estrada para 200 t, com tração elétrica GE, a ser fabricado sob licença de uma empresa norte-americana não revelada; sem conseguir fechar um acordo de transferência de tecnologia, a Verolme desistiu do projeto. A seguir enveredou para o segmento de carros de bombeiro, produzindo algumas unidades a partir do furgão Mercedes-Benz 608 D. Suas iniciativas teriam um pouco mais sucesso na área militar, embora para aplicações terrestres e não navais.
O primeiro equipamento completo a ser concluído – e único a ser comercializado em pequena quantidade – foi o caminhão para combate a incêndio em aeroportos São Bernardo, apresentado em julho de 1985. Dotado de tração nas quatro rodas, toda mecânica foi emprestada da Scania (chassi, eixos, caixa de cinco marchas com redução, motor de 370 cv). Com peso operacional de 14 t, possuía bloqueio dos diferenciais, guincho, tanques para água, espuma e pó e moderna carroceria de alumínio de perfil baixo e cabine avançada; sua bomba de alta pressão permitia vazões de até 4.000 l/min e alcance de 60 m.
O segundo projeto militar da Verolme, do qual foi construído apenas o protótipo, teve gestação mais lenta. Os planos iniciais previam a fabricação seriada, para exportação para a Europa e EUA, de um obuseiro rebocado (FH 70) com alcance de 30 km, arma então adotada pelas tropas da Otan. Projetado para disparar projéteis de 155 mm, foi desenvolvido em conjunto pela britânica Vickers, a alemã Rheinmetall e a italiana Oto Melara. O projeto acabou se desdobrando em outro muito mais ambicioso: a produção, também para os países-membros da Otan, de um obuseiro autopropelido sobre lagartas, a ser equipado com o canhão do FH 70. Ainda em fase de desenvolvimento pela Vickers, teria motor Cummins de 600 cv, importado dos EUA. Por ser arma de retaguarda, o veículo não teria blindagem.
Oficialmente denominado AS90 Mallet, a Verolme foi responsabilizada pela construção do protótipo, concluído a tempo de ser exposto em junho de 1986 na British Army Equipment Exhibition. Nos testes o carro revelou peso de 35 t (incluindo 42 obuses a bordo), autonomia de 500 km e alcance de tiro de 41 km. O sistema automático de pontaria permitia a cadência de seis lançamentos por minuto.
Os prejuízos permanentes ocasionados pela instabilidade do setor naval, porém, não conseguiram ser neutralizados pelos novos negócios da Verolme. O quadro econômico-financeiro da empresa se deteriorou, inviabilizando o acordo com a Vickers. Em 1991, já concordatário, o estaleiro foi comprado pelo polêmico empresário Nelson Tanure, que já controlava a Emaq, em menos de três anos também assumiria a Ishikawajima e em pouco tempo colocaria todas em situação pré-falimentar.
Depois de passar por longo período de inatividade, no ano 2000 a Verolme passou a ser administrado pelo grupo Keppel Fels, sediado em Cingapura, ironicamente hoje também controlador da Verolme holandesa. Quanto ao obuseiro AS90, foi colocado em produção seriada na Grã-Bretanha, sendo até hoje fabricado em grande quantidade pela BAE Systems, sucessora da Vickers.