Fábrica de carrocerias de caminhão e implementos rodoviários fundada em 1961, em São Paulo (SP), por um grupo de antigos sócios da Massari. Com a razão social Biselli Viaturas e Equipamentos Industriais Ltda., a empresa cresceu rapidamente e em poucos anos se tornou uma das quatro maiores do setor. Nos anos 70 começou a produzir carros para transporte de valores e logo passou a fornecer carrocerias e reboques para o Exército e a Marinha. Esses fornecimentos estreitaram o seu relacionamento com as Forças Armadas, que a convidaram a participar diretamente do Programa Militar Brasileiro, em conjunto com outras empresas privadas. Seus primeiros comissionamentos ocorreram em 1973, quando foi encarregada pelo Exército Brasileiro de realizar o repotenciamento dos velhos carros de combate norte-americanos M3A1 Stuart. Estes eram tanques leves sobre esteiras da II Guerra Mundial, cedidos ao Brasil nos anos 50 por conta dos Acordos de Assistência Militar Brasil-EUA. Desatualizados tecnologicamente, equipados com motores radiais a gasolina de elevado consumo e necessitando de peças de reposição não encontradas no mercado, foram escolhidos pelos órgãos de pesquisa e desenvolvimento do Exército para um projeto piloto de modernização, do qual a Biselli e outras empresas privadas foram convidadas a participar.
Os parâmetros e especificações definidos levaram a uma reforma tão profunda que deu origem a um novo tanque – o X1-A1. A modernização envolveu troca do motor por uma unidade diesel Scania de 280 cv, reforço da blindagem, lagartas mais largas e alteração do desenho da carroceria para alojar os novos componentes (especialmente na traseira, que recebeu uma grade horizontal acomodada aos novos radiadores); câmbio e transmissão permaneceram os originais, sendo recondicionados pelo próprio Exército. A torre foi substituída por outra, projetada pela Bernardini, equipada com canhão de 90 mm e moderno sistema ótico de pontaria. Com 100% de nacionalização, este foi o primeiro carro de combate sobre lagartas construído no país.
Após a modernização de 53 unidades, modificações ainda mais radicais foram introduzidas, as principais das quais a transmissão automática Allison e nova suspensão (da Bernardini) com seis roletes de apoio de cada lado, em lugar de quatro. A nova suspensão, por sua vez, obrigou ao aumento das dimensões do veículo, 20 cm mais longo, e à construção de novo casco. A mecânica continuou a mesma, mas foi aplicada uma torre maior, com acionamento hidráulico, fabricada pela Engesa. O novo blindado, com 20 toneladas, acolhia três tripulantes e atingia 60 km/h, com 580 km de autonomia. Sob a designação X1-A2 Carcará, entrou em produção seriada.
Em 1975 foi envolvida no processo (frustrado) de modernização dos tanques Sherman, do Exército. Naquela oportunidade a Biselli foi encarregada de alterar a suspensão do carro, que pouco antes já havia sido remotorizado e submetido a profunda reforma. A partir daí a presença da empresa passou a ser constante nos trabalhos que envolvessem blindagens, se estendendo aos projetos e à construção do lança-foguetes e do lança-pontes derivados do Carcará e, mais tarde, do tanque Caxias (todos fabricados pela Bernardini).
Também em 1975 foi contatada pela Marinha para construir um sucedâneo dos anfíbios norte-americanos DUKW, equipamentos da II Guerra ainda em uso pelos Fuzileiros Navais, destinados a ações de embarque e desembarque de tropas, inclusive em situação de mar agitado. Os primeiros protótipos foram concluídos em 1978 e submetidos aos testes usuais, que aprovaram o projeto e sugeriram alterações adicionais. As modificações foram agregadas, mas dos 25 anfíbios programados pela Marinha apenas cinco foram encomendados. Batizado Camanf (de “caminhão anfíbio”), o veículo foi construído sobre chassi Ford F-7000 modificado, com tração 6×6 e motor nacional Detroit Diesel de 145 cv, que através de uma caixa de transmissão GMC acionava as rodas e as duas hélices da popa. Os pneus eram à prova de bala e tinham sistema remoto de regulagem da pressão do ar. Seu casco, fabricado em aço, tinha proa reforçada e guincho na traseira. Os testes da Marinha indicaram o seguinte desempenho: capacidade de carga de 5 t (motorista mais 58 homens; em mar agitado a capacidade era reduzida pela metade), podendo tracionar mais 2,5 t; na terra, velocidade de 72 km/h e autonomia de 430 km (no mar, 14 km/h e 18 horas de autonomia); vencimento de rampas de até 60%.
Naquele período a Biselli projetou seu segundo (e último) veículo automotor – uma “mula mecânica”, segundo o jargão militar uma categoria de carros de construção espartana, baixo peso e sem carroceria ou cabine fechadas, capazes de serem lançados de pára-quedas e eventualmente descartados ao final das ações de combate. O carro trazia um chassi com alta capacidade de torção, bem adaptado às irregularidades do terreno; era acionado pelo motor Volkswagen 1300 refrigerado a ar, que levava o veículo a até 70 km/h, na estrada. Dependendo da carroceria (reduzida ao mínimo essencial), podia transportar quatro pessoas e carga, ou o motorista e um operador de canhão de até 105 mm.
Pressentindo limitações no mercado militar, a empresa buscou diversificar sua atividade principal – a produção de equipamentos de transporte de carga – em 1977 firmando um acordo de cooperação com a italiana Cometto, voltado para a construção de reboques extra-pesados para cargas indivisíveis; a médio prazo seriam também fabricados modelos automotrizes para até 750 t. A recessão econômica, contudo, se avizinhava e o projeto logo foi abandonado. Em 1980 a empresa tentou retornar ao mercado de carros-forte para o transporte de valores, do qual havia se retirado dois anos antes; pretendia se especializar na fabricação de unidades pré-montadas “para rápida colocação sobre o chassi“, mas não teve sucesso.
A Biselli foi uma das primeiras vítimas da desaceleração do Programa Militar Brasileiro. A empresa nunca fez parte do primeiro escalão dos fabricantes de equipamento militar do país, participando marginalmente, como sub-fornecedor na modernização de tanques usados. Os dois únicos veículos pelos quais foi responsável não tinham conteúdo tecnológico significativo nem obtiveram encomendas das Forças Armadas; assim, nunca teve o que oferecer ao mercado externo. Em paralelo, a recessão econômica do início da década de 80 trouxe dificuldades também para seus negócios civis, levando-a a requerer concordata em 1984. A empresa sobreviveu, contudo, mantendo-se como fabricante de equipamentos de transporte. Em 2004 encerrou as portas definitivamente.