sábado, 6 de janeiro de 2018

Fairchild PT-19 & PT-3FG

História e Desenvolvimento.


Em fins da década de 1930, o treinamento dos pilotos do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) era feito pelos Boeing PT-17 Stearman, que apresentava comandos dóceis e facilidade de pilotagem, não forçando os cadetes a desenvolver melhores habilidades, que futuramente seria exigida quando fosse manusear os modernos caças de combate. Com a finalidade de sanar esta deficiência a USAAC viria a abrir uma concorrência para o desenvolvimento de um monomotor monoplano que aliasse o aumento na habilidade de pilotagem aos baixos custos de manutenção e operação

Em 1939, foram avaliados 18 modelos apresentados por oito empresas americanas, entre elas estava a Fairchild com sua aeronave M-62, que havia concebido como um monomotor de asa baixa, cabine aberta com dois lugares em tandem e trem de pouso fixo, cuja estrutura era formada por tubos metálicos soldados, com cobertura de lona na fuselagem e asas e contraplacado de madeira na cabine de pilotagem. Seu primeiro protótipo alçou voo nas instalações da empresa em Hagerstown, Maryland em 7 de maio de 1939.
Aprovado na avaliação, o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos assinou um contrato com o fabricante para a produção de 270 aeronaves que passaram a ser designadas como PT-19, estando equipado com um motor em linha invertido Ranger L-440 de 175 HP. Colocado em operação imediatamente o modelo conquistou a simpatia de instrutores e alunos das escolas militares de aviação do USAAC. Um nova versão designada PT-19 seria colocada em produção a partir de 1941, apresentando como principal diferença a adoção do motor  Ranger L-440-3 de 200 HP. O eclodir da Segunda Guerra Mundial na Europa iria determinar a produção em massa, pois havia a necessidade emergencial de formar pilotos em larga escala, desta maneira a produção seria pulverizada entre as fabricas da Fairchild, Aeroanca Middletown e St. Louis Aircraft Corporation, com produção de 3.703 células do PT-19A pelas três plantas fabris. 

Com a necessidade de se treinar os pilotos para voo por instrumentos, seis modelos do PT-19A foram modificadas na parte instrumental e introduzida uma cobertura do tipo capota, de lona, que podia ser puxada sobre a cabine da frente permitindo que o cadete realizasse o voo completamente às cegas e somente por instrumentos. Essa nova versão passou a ser denominada PT-19B com a produção sendo distribuída a Fairchild e Aeroanca Middletown atingindo a cifra de 917 unidades construídas. Geralmente confunde-se o PT-19B para treinamento de voo por instrumentos com o PT-26, uma versão exclusiva para as Forças Armadas Canadenses, que possuía a cabine coberta, que visava proporcionar mais conforto para os tripulantes, muito em função das condições climáticas daquele pais.
Considera se o PT-19 com um dos marcos da história da aviação, pois foi a aeronave de treinamento primário que efetuou a transição entre os lentos e frágeis biplanos e os modernos monoplanos e melhor e maior desempenho, tendo como principal consequência uma melhor formação das habilidades e rendimento dos alunos. Suas vantagens como treinador foram percebidas por outros países, sendo inclusive produzido sob licença no Canada e Brasil a fim de se desafogar as linhas de produção americanas. Ao todo foram entregues 7.742 unidades dispostas em 10 versões com emprego pelos Estados Unidos, Canada, Brasil, Chile, China, Colômbia, Equador, Haiti, India, México, Nicarágua, Noruega, Paraguai, Peru, Filipinas, África do Sul, Rodésia, Reino Unido, Venezuela e Uruguai. Atualmente existem ainda centenas de aeronaves em condições de voo sendo mantidas por museus ou colecionadores.

Emprego no Brasil.

Em 1941 a recém-criada FAB, tinha por missão principal a formação de pilotos para a operação dos novos modelos de combate e transporte que estavam sendo recebidos, ocorre porém que a grande maioria de seus vetores de treinamento era composta por obsoletos biplanos herdados da Aviação Naval e Militar que além de apresentarem altos índices de indisponibilidade, não eram adequados mais a formação de pilotos para as aeronaves de alto desempenho que iriam cumprir as missões destinadas a compor o esforço de guerra brasileiro junto aos aliados. A fim de se atender esta demanda a Força Aérea Brasileira, fazendo uso dos termos do programa Leand & Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos) veio a adquirir 100 células do Fairchild PT-19 Cornell que seriam entregues a pilotos brasileiros nas instalações do fabricante na cidade de Hagerstown, Maryland. O desafio de trazer estas aeronaves ao Brasil seria de grande complexibilidade, pois o intensificar da batalha do Atlântico com a crescente ameaça dos submarinos alemães e italianos, neste período inviabilizava o transporte das aeronaves desmontadas por via marítima.

Apesar de não aconselhável a única opção restante era o translado por via área, quando todas as aeronaves seriam trazidas em voo, dos Estados Unidos ao Brasil por pilotos da FAB, sem dúvida, isso significava que tais oficiais iriam cumprir uma missão do mais alto risco, pois na década de 1940, existiam poucos campos de pouso na América Central e na região norte da América do Sul, facilidades como auxílios-rádio à navegação e infraestrutura de apoio logístico e de manutenção, então, eram praticamente inexistentes, além disso a aeronave por ser destinada ao treinamento primário não era apropriada para uma viagem tão longa e perigosa, pois além de serem construídos em madeira, tinham cockpits abertos e pequena autonomia, seu motores Ranger L-440, de seis cilindros invertidos consumia grande quantidade de óleo lubrificante, que poderia ser escasso em termos de reabastecimento durante a jornada, pesava também como fator de risco a ausência de rádios e de instrumentos de navegação;
Os aviões, recebidos na fábrica, eram geralmente reunidos em grupos de 5 aeronaves, cada uma das quais pilotada por um único oficial. Na nacele dianteira, era instalado um tanque suplementar de combustível, para aumentar o alcance do pequeno avião. Para cada uma das primeiras esquadrilhas, era incorporado um avião Fairchild UC-61, nessa aeronave, viajavam o comandante da esquadrilha, um sargento mecânico e um piloto reserva. A quantidade de bagagem que cada avião trazia era mínima, devido à necessidade de se trazer várias latas de óleo lubrificante para os motores Ranger. Entre julho e agosto de 1941, trinta PT-19 foram trazidos em voo, desde Hagerstown até o Campo dos Afonsos, através da América Central continental e do litoral da América do Sul, pois era praticamente impossível, naquela época, sobrevoar a Amazônia pelo interior. Essas primeiras esquadrilhas fizeram um voo realmente épico. Como o Brasil já estava praticamente às portas da guerra, não havia como esperar que a época das chuvas passasse. As condições meteorológicas, eram horríveis. Enquanto as aeronaves voavam acima do território dos Estados Unidos, o ar era quente e seco, e a névoa seca dominava amplas regiões. A partir da América Central, o ar era sempre muito úmido, com formação frequente de CBs e muitas pancadas de chuva, até o Rio de Janeiro. Os oficiais americanos, ao tomarem conhecimento da intenção dos pilotos brasileiros de levarem os PT-19 em voo para o Brasil, fizeram sombrias previsões de que pelo menos 40 % dos aviões ficariam pelo caminho, pois as condições eram imprevisíveis e os aviões não eram feitos para isso.

Embora o risco da viagem fosse óbvio, só houve uma perda de vida em todas as viagens durante toda a Guerra: o Primeiro-Tenente Aviador QO Aux. Kenneth Lindsay Molineaux, acidentou-se com o seu PT-19 quando sobrevoava o Território do Amapá, sob forte chuva. Além dessa aeronave, houveram somente mais duas perdas de aviões PT-19, mas ambos os pilotos sobreviveram. Isso dá um índice de perda de menos de 3 % do total de 106 aeronaves PT-19 que foram transladadas em voo dos Estados Unidos ao Brasil, durante toda a Guerra. As perdas de outros tipos de aeronaves foram ainda menores, furando as terríveis previsões dos americanos de perda. Ao longo do conflito mais 65 aeronaves incluindo algumas unidades da versão de treinamento por instrumentos PT-19B seriam entregues desta maneira.
Em operação no Brasil foram empregados pela Escola de Aeronáutica no Campo dos Afonsos e tambem alocadas em algumas bases aéreas como aeronaves de ligação. No intuito de se aumentar o número de aeronaves a disposição da FAB, o Ministério da Aeronáutica firmou um acordo com o governo americano para a para a produção sob licença nas instalações da Fábrica do Galeão, com o modelo designado localmente como 3-FG, as 20 primeiras unidades foram montadas com partes importadas, mas aos poucos os componentes foram sendo nacionalizados à exceção do motor. Ao todo foram produzidas até 1947 234 unidades do PT-3FG. Ao longo de toda sua carreira, os PT-19 foram responsáveis pela formação de mais de 2.500 pilotos brasileiros até fins da década de 1950 quando passariam a ser substituídos pelos novos Fokker S-11, as células sobreviventes foram doadas a diversos aeroclubes espalhados no Brasil.

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